sexta-feira, abril 04, 2025

TOLERÂNCIA96 – TOLERÂNCIA E AUTORIDADE

 TOLERÂNCIA96 – TOLERÂNCIA E AUTORIDADE

Volta e meia vem-me à cabeça o pensamento de que os jovens não querem sentir as amarras da autoridade, mas, ao mesmo tempo, os jovens desejam a segurança e a estabilidade da autoridade.

Atrelado a este pensamento vem logo a questão da autoridade e do autoritarismo.

Na esfera da Política — e se calhar porque vêm aí mais umas eleições, eleições em que cada vez mais jovens votam (pelo menos têm idade para votar) e cada vez menos velhos votam —, a questão da autoridade e do autoritarismo tem a ver com a ascensão dos partidos extremistas, sobretudo os de extrema-direita.

No dossier « D'où vient le désir d'autorité ? » (Donde vem o desejo de autoridade?), da revista Sciences Humanies », publicado em 20 de Fevereiro de 2025, vem publicado um artigo, “L'autorité, pourquoi en vouloir plus ?” (Porque se deseja mais autoridade?), sendo o texto da autoria de Nicolas Journet, e do qual destaco o seguinte:

[…] Cansaço democrático (Prefiro traduzir por Lassidão democrática)

No entanto, seria errado interpretar qualquer exigência de autoridade como inspirada por um sentimento de insegurança ou de perda de identidade. O apagamento da autoridade sagrada pela modernidade significa que a vida em comum já não pode ser considerada um dado adquirido. Livres e iguais perante a lei, os indivíduos têm de negociar constantemente acordos, obter o consentimento dos outros e argumentar para o fazer. Mas a autoridade, tal como Hannah Arendt a entende, não tem de ser argumentada, não tem de convencer. Tal como o uso da força, a obrigação de se justificar significaria o fracasso. Neste sentido, a autoridade pura, segundo a filósofa, não se coaduna com as formas liberais de governação, que exigem que o poder se explique, argumente, negoceie e, eventualmente, persuada. É por isso que o autoritarismo, ao contrário da autoridade, se opõe muitas vezes à democracia.

O funcionamento das instituições políticas democráticas também pode conduzir a bloqueios: a ausência de maioria e o impasse das negociações, a insatisfação económica e os conflitos sociais repetidos são motivos de exigência de uma gestão autoritária dos assuntos públicos. Várias sondagens de opinião realizadas em França nos últimos vinte anos mostram que a opinião pública, nomeadamente entre os jovens, é cada vez mais tolerante em relação a formas de governo autoritárias. Em 2000, 63% deles diziam-se atraídos pela figura do “líder sem contra-poder”, sem especificar de que tipo. Esta “cesarização” da autoridade governativa não põe directamente em causa a escolha popular, mas o princípio da independência dos poderes executivo, legislativo e judicial: a autoridade do Chefe de Estado subordina-se à do legislador e à do juiz. Paradoxalmente, esta forma de governação acomodaria os procedimentos democráticos directos. No entanto, quer lhes chamemos “iliberais” ou “democraturas”, os regimes conformes a este modelo observados na Hungria ou na Eslováquia não passam sem reduzir as liberdades públicas: liberdade de expressão, de reunião, de manifestação, etc., porque a preocupação é reduzir outros poderes: os meios de comunicação social, os partidos políticos, os organismos intermediários.

Por outro lado, não se inspiram necessariamente na tradição ou na restauração de uma ordem perdida. Uma análise do investigador Simon Guillouet sobre a situação da opinião pública francesa em 2023 revelou uma tendência, ainda que minoritária, a favor deste estilo de governo. O autor conclui que existe uma procura de eficácia: um francês em cada cinco estaria disposto a aceitar um regime menos liberal, desde que este fosse capaz de “resolver os problemas” que as instituições actuais se mostraram incapazes de resolver. Se os regimes autocráticos são também designados por autoritários, não é propriamente em nome de um valor transcendente, mas porque estão dispostos a limitar o espaço de discussão. Trata-se de uma faca de dois gumes, se quem a reclama se arrisca a ser silenciado.(1)

Não sei se teria sido necessário fazer tão extensa transcrição para chegar ao ponto a que quero chegar: a de estarmos perante um tipo de Tolerância a que chamarei tolerância-desistência.

É como se dominasse a consciência duma exaustão e, ao mesmo tempo, duma falta de perspectiva de saída, de boa saída. Quem sabe, é precisamente a essa consciência que os senhores dos poderes políticos, económicos e financeiros querem levar as populações dos países.

Mais que nunca, na escola o contacto com alunos que não são simplesmente os que frequentam a disciplina de Psicologia tem sido especialmente frequente e intenso. Até ao 9.º ano, são alunos que me vêm fazer inquéritos e pedidos de ajuda para os seus trabalhos — são jovens que se entusiasmam com duas ou três coisas que a gente lhes diga e sugira, eles querem passar logo à acção! A partir do 10.º ano, a mundividência torna-se outra, mais calculista, o entusiasmo modifica-se, envolve-se de ambição e sucesso: sucesso académico, sucesso desportivo; e desperta a ambição política.

Vulgarizou-se a exortação dos jovens: «Não desistas dos teus sonhos!», mas elas não matam, mas moem, e vemos, aos poucos, os jovens a resvalarem para essa tal tolerância-desistência. O que fazer?

Fará sentido uma pedagogia do «Não desistas dos teus sonhos!»? Penso que sim. E penso que um dos ingredientes preciosos dessa pedagogia é o lema do «Tu não estás sozinho.»

Todos os outros poderão desistir, mas a Pedagogia e a Educação não! Não lhes falte a tenacidade, a resistência, o coração de maratonista — que não corre sozinho, mas em equipa. Dentro daquela ideia de que é preciso toda uma aldeia para educar uma criança.

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(1) Traduzido com a versão gratuita do tradutor - DeepL.com

quinta-feira, abril 03, 2025

#TOLERÂNCIA95 – A BIOLOGIA DA TOLERÂNCIA

 #TOLERÂNCIA95 – A BIOLOGIA DA TOLERÂNCIA

Já quase não cabem no Facebook, transbordam-no, os pequenos vídeos, amadores, de gentes que participam em safaris de faunas africanas e sul-americanas abundantes.

Hoje, à hora do pequeno-almoço, vi dois. Deixaram-me a pensar.

Um deles era sobre as capivaras, apresentado como animal bastante sociável e tolerante que quase não dá para acreditar. O outro era sobre a tentativa dum leão caçar um búfalo africano: quase oito minutos de luta, desta vez ganhou o búfalo, o leão parece, mesmo no fim, que, ofegando já sem forças, se ajeita na posição de deitado para morrer, seria o seu derradeiro aconchego.

Em relação às capivaras, interrogo-me se se trata dum traço de personalidade — qualquer coisa à

semelhança do que se diz dos bonobos que, sendo praticamente indistinguíveis dos chimpanzés, tenderão a resolver os conflitos entre si ao jeito do “make love, not war”, ao passo que os chimpanzés tenderão a ser mais ao contrário, ou seja, mais do tipo “make war, not love” —, ou uma estratégia evolutiva, em que as boas relações sociais, eventualmente mutualistas, são mais vantajosas à sobrevivência do que as relações de competição, disputa e agressão.

No vídeo do leão e do búfalo, o que me impressionou especialmente foi o búfalo: já o leão não se conseguia levantar, o búfalo ficou ali parado, de frente para o leão. Não se afastou, não desferiu qualquer investida final sobre o leão (um ser humano não se teria ficado assim, a raiva certamente pediria expansão violenta sobre o atacante assassino), havia no comportamento do búfalo que me fazia pensar na Tolerância. Era como se o búfalo assumisse a consciência (Cá está o antropomorfismo…) de que tinha de estar disponível para aquela luta de sobrevivência até ao fim porque é assim que a Natureza manda, tanto aos leões como aos búfalos, aos predadores e às presas.

O mito bíblico do Jardim do Éden (bem como espaços artificiais de vida selvagem actuais) mostra que a abundância de recursos alimentares elimina a competição, a luta pela sobrevivência. A realidade da escassez desses recursos (e de outros, por exemplo, espaços de habitats para as populações animais permanecerem e se deslocarem) faz aumentar a disputa e a competição. A abundância é amiga da Tolerância, a escassez não é.

É com alguma ligeireza que penso que possa haver qualquer coisa “tele”, que esteja nos contextos de vida que sabiamente avise que a tolerância entre as espécies e a tolerância nos comportamentos é amiga da poupança dos recursos de vida disponíveis, ganhando todos com a Tolerância recíproca que mostrarem.

Nas sociedades humanas, nelas vale o ditado que diz que “Casa onde não há pão, todos ralham e ninguém tem razão”.

Ora, se a Tolerância tem raízes biológicas, é à Política que cabe a responsabilidade de gerir, negociar, adaptar, distribuir entre diferentes, entre contrários, entre opositores, entre rivais, entre competidores, de modo a que se faça a distribuição justa, equilibrada e equitativa dos recursos necessários a satisfatória subsistência dos grupos e das sociedades humanas.

Neste modo de ver, o que cabe então à Pedagogia e à Educação? Mais do que falar, é fazer a experiência da cooperação, da interajuda, do mutualismo; da gestão de recursos limitados; da Tolerância da espera, do possível e das diferenças das necessidades duns e outros. Mostrar, através de jogos e projectos concretos, que a parcimónia, a moderação são opções que satisfazem mais membros dos grupos.

Num ‘site’ de notícias da BBC em português, leio que o notável Presidente do Uruguai, José Mujica um dia disse assim: «Eu não sou pobre, eu sou sóbrio, de bagagem leve. Vivo com apenas o suficiente para que as coisas não roubem minha liberdade.» É o desafio da sobriedade como maneira de vencer o aparentemente insolúvel dilema dos ricos e pobres: os pobres que querem ser ricos e os ricos que não querem ser pobres. A solução pode estar mesmo na aprendizagem e aceitação da sobriedade.

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quarta-feira, abril 02, 2025

#TOLERÂNCIA94 - A GRATIDÃO É COISA DIFÍCIL?

 #TOLERÂNCIA94 - A GRATIDÃO É COISA DIFÍCIL?

Esta fase do ano escolar é-me sempre especialmente intensa por causa da entrega das versões finais dos Trabalhos Monográficos dos alunos.

São trabalhos que os alunos vão desenvolvendo ao longo do ano lectivo, e cuja essência é a do contacto pessoal, directo, com uma pessoa que é, seja porque razão for, objecto dum respeito, fascínio, admiração ou afectividade especial. A grande maioria das pessoas escolhidas são os avós e as avós. Como eu digo e redigo, citando o autor ou um dos seus mil e um ecos, «Aprende-se mais a ler num homem do que em dez livros.»

Os trabalhos são também oportunidade para o amadurecimento pessoal e social. Eu não dou aulas sobre

a Psicologia das Relações Pessoais, eu procuro que cada tarefa escolar, cada dinâmica de sala de aula, seja uma oportunidade de educação e aprendizagem das relações pessoais, vividas momento a momento, tarefa a tarefa, reflexão a reflexão, avaliação a avaliação.

Mais uma vez tive muitos trabalhos (a grande maioria) ricos de dedicação, empenhamento pessoal; de descobertas humanas, não apenas por causa de tanta coisa que os alunos ficaram a saber, por exemplo, dos seus avós, mas também por causa do que descobriram acerca de si mesmos.

Há trabalhos tão carregados de afectividade positiva, muito carinhosa; e de tão grande cuidado na sua apresentação, que, depois de os lermos, estranhamos que não haja uma única palavra de agradecimento aos avós e às outras pessoas que colaboraram na realização dos trabalhos. Sim, na maioria dos trabalhos, nem uma vez aparece a frase duma palavra só: «Obrigado!»

Há uma manifesta, e muito generalizada, ausência da expressão da gratidão. Não bastam os mimos, os abraços, as juras de «Gosto muito de ti, avó!», é preciso ser-se capaz de expressar gratidão com as palavras, usando a fala. A fala compromete o falante, muito mais do que o silêncio, que em si é de ouro. É por terem clara noção do compromisso que a palavra falada contém, que os Chefes da Igreja Católica há muitos séculos criaram a figura da designação de novos cardeais com a forma (ou modalidade) "In pectore": a palavra falada tem riscos, repito, compromete.

Ora se a falta de expressão da gratidão nos adultos é censurável, nas crianças e nos jovens ela deve ser tolerada. Tolerada porque se assume que as crianças e os jovens podem afirmar na primeira pessoa, como um dia cantou António Aleixo: «Não sou esperto nem bruto / Nem bem nem mal-educado / Sou simplesmente o produto / Do meio em que fui criado.»

A indiferença e a falta de gratidão entre os jovens — seja para com familiares, professores ou amigos — muitas vezes não são fruto de maldade, mas são resultado da falta ou do excesso de algumas coisas. Há quem diga que a gratidão não é inata, mas que se adquire, treina-se cresce com a experiência e a aprendizagem. Eu não penso exactamente assim: eu acredito na educação, no treino e na aprendizagem, mas a observação dos bebés e das crianças pequenas tantas vezes nos mostram o prazer que as crianças têm em expressar contentamento e gratidão. Só que depois... desaprendem! Alguma coisa ou alguém as deseduca.

A frase seguinte não é minha, apanhei-a por aí, algures: «Tolerância não é concordar, é respeitar. Gratidão não é obrigação, é reconhecimento.»

A Educação tem de saber promover e ensinar a Tolerância. A Educação tem de saber ensinar que a gratidão não é obrigação, é reconhecimento.

A primeira condição da Educação da Gratidão é a existência (desejadamente abundante) de modelos que se aprendem por mecanismos de imitação e modelagem dos mais velhos.

Esquematizando:

— o seu humano nasce com a capacidade / competência / dom / motivação (seja como seja) de agradecer.
— algures no seu desenvolvimento pessoal, a criança afasta-se, é levada a afastar-se, da sua natureza sócio-afectiva.
— em qualquer altura, pode-se promover a educação da Gratidão nas crianças e nos jovens.
— o principal ingrediente da expressão da gratidão é o exemplo (ou o modelo) dos mais velhos.

Assim, aceite-se e pratique-se a Tolerância da ingratidão dos mais novos. Aceite-se na condição dum projecto de educação pessoal e social sustentado, sem pressas e que não se centre no aprofundamento do sentimento de culpa.

Cada um dos elementos do esquema anterior pede, nesta viagem, o seu próprio desenvolvimento. A eles iremos em próximas jornadas.

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terça-feira, abril 01, 2025

#TOLERÂNCIA93 - NÓS E O SOFRIMENTO DOS OUTROS

 #TOLERÂNCIA93 - NÓS E O SOFRIMENTO DOS OUTROS

Nem sempre nos é fácil tolerar o sofrimento dos outros. Não sei mesmo até que ponto estamos a tornar-nos cada vez mais intolerantes.

O sofrimento dos outros obriga-nos a parar quando queríamos continuar a andar, sem interrupções. Ou obriga-nos a dar atenção a uma coisa quando não queríamos desviar a atenção da outra coisa em que estávamos focados. Ou obriga-nos a fazer uma coisa quando não queríamos interromper a outra que estávamos a fazer. Ou... ou... ou...

O sofrimento do Outro gera desconforto em que está ali ao lado. Os psicólogos dirão que o sofrimento expressa vulnerabilidade pessoal, e na vulnerabilidade do Outro a gente espelha a expectativa da nossa. Curiosamente, a fonte que gera o nosso desconforto é a mesma que gera o impulso para ajudarmos o Outro que sofre: é a empatia.

Perante a reacção empática, pode acontecer-nos duas coisas: aproximamo-nos ou fugimos. Na verdade, a empatia pede esforço e envolvimento, e nem sempre estamos disponíveis, seja para nos esforçarmos, seja para nos envolvermos.

Este tema pede profundo e delicado desenvolvimento. É tempo de que agora não disponho.

Só mesmo uma ou duas coisas mais por agora:

Há quem diga que a Tolerância ao sofrimento do Outro (não digo Alheio porque dizer alheio refere-se mais a quem está distante, é falar de maneira despersonalizada; o Outro é o Outrem de antigamente, é alguém que está ali ao pé de nós) é um acto de coragem. Sim, concordo, não deixa de requerer alguma coragem: temos de descentrar-nos de nós mesmos, temos de aceitar ver e ouvir; ser conduzidos em vez de conduzirmos; temos de aceitar agir em vez de nos mantermos passivos, como se vulgarizou dizer, sem sairmos da nossa zona de conforto.

Também há quem diga que a resistência ou incapacidade de tolerar o sofrimento do Outro é, em última instância, a negação da própria humanidade, da nossa própria humanidade.

Hoje entrei no Metro, ocupei o lugar que gosto de encontrar disponível (a porta do outro lado da

carruagem, numa das pontas). Atrás de mim, sem que eu me tivesse dado conta dele antes, entrou um sujeito de que me dei conta porque se sentou no chão, ali perto de mim, na outra ponta da porta em que eu ia encostado. Olhei para ele, estava cheio de feridas e pústulas na cara e nas mãos.

Dei-me conta que desejei que o cheiro do homem não chegasse a mim; e menos ainda que ele me abordasse, fosse de que maneira fosse. Eu, que já de ia de livro na mão, pequei na leitura, e dei-me conta de pensar que não queria ser interrompido na leitura por aquele homem. E já vinha a descomprimir das tarefas da escola, que me tinham sido exigentes de atenção e comunicação verbal.

Depois da minha reacção impulsiva, aos poucos fui sendo invadido por um sentimento de serenidade. Tomei consciência de que se aquele homem, com ar de Job, me abordasse eu não o renegaria, fecharia o livro e dar-lhe-ia atenção; se tivesse de tocá-lo (por exemplo, se ele me pedisse ajuda para o levantar) eu fá-lo-ia.

O senhor — Será que não seria mesmo o Job da Bíblia? —, quando a composição pára na estação da Bela Vista, levanta-se e sai. Não sei se deu conta da minha existência, eu dei-me conta da dele. Ele foi haver-se com o seu sofrimento, certamente não tem em espaço mental disponível para olhar as pessoas à sua volta: é ele, o seu sofrimento, ele faz o que pode para se sentir bem, como eu faço também o que posso para me sentir bem.

A proximidade àquele Job do século XXI fez-me sentir bem, gostei de tido aquela experiência de humanidade, da minha humanidade. Tolerei o sofrimento do Outro (ou deveria ter dito que tolerei a ameaça do sofrimento do Outro?) e tolerei a minha própria reacção impulsiva.

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segunda-feira, março 31, 2025

#TOLERÂNCIA92 - PRESIDENTES. DO FUTEBOL E DO COMITÉ OLÍMPICO.

 #TOLERÂNCIA92 - PRESIDENTES. DO FUTEBOL E DO COMITÉ OLÍMPICO.

Apetece-me dizer: «Não há pachorra...». Dito doutra maneira, «Não há Tolerância que baste».

Os valores do Desporto. Os valores do Ideal Olímpico. Os senhores presidentes da Federação Portuguesa de Futebol e do Comité Olímpico de Portugal não deveriam ser os primeiros a dar o exemplo do fairplay, da sã camaradagem no desporto, da ética desportiva, da aceitação harmoniosa do Outro que compete connosco, da cordial resolução de conflitos, e sei lá que mais?


Pois que vemos nós entre coisas "inadmissíveis", "gravíssimas insinuações", "o caminho da destruição", e sei lá que mais?

Que pedem os dois senhores presidentes das duas mais importantes estruturas do Desporto Português a quem pratica desporto, qualquer que seja a modalidade, e a quem gosta de apreciar a prática desportiva dos atletas?

Do que eles pedem a todos nós, que exemplos de boas práticas, que nos sirvam de modelo, dão eles nos cargos que desempenham? Que educação ou deseducação estão eles a proporcionar a quem pratica ou aprecia o Desporto pela arte, desempenho físico, emoções e dinâmicas de relação em grupos e aos pares que desperta ou cria?

Que grau de Tolerância revelam eles pelas diferenças, divergências e diversidades recíprocas?

Que grau de Tolerância pode, ao cidadão comum, ao atleta e ao espectador desportivo, ser pedido ou exigido?

Desabafarão alguns que é uma questão de poleiros ou de vingançazinhas pessoais... Mas não terão os dois senhores presidentes obrigação pessoal, institucional e ética de as ultrapassarem de forma harmoniosa, a bem do Desporto e do Ideal Olímpico?

Que nos mostra este caso?

Que a Educação dos valores do Desporto e do Relacionamento Pessoal falhou?
Que, por muito que a Educação consiga, a Educação não assegura que os bons resultados se mantenham para sempre?
Qua a Educação não é só um assunto das crianças e dos jovens, é também um assunto dos crescidos?
Se educar é fazer adquirir, e se, aparentemente, se perde o que se adquire, então aos adultos não se faz Educação mas sim Reeducação?

Quase num aparte, apetece-me dizer que Putin afirmou que invadiu a Ucrânia porque queria libertar a Ucrânia do regime fascista de Zelensky; agora, o porta-voz do Kremlin vem dizer que é um atentado à democracia a condenação de Marine Le Pen, a líder da extrema-direita francesa... Não, não são os valores e os ideais da Extrema-Direita que estão em jogo; isso sim, os interesses políticos, mesquinhos, de dominação desonesta dos Outros.

Que pode um professor, face aos alunos que o questionam, como fazia o aluno dos Resistência que trazia a fisga no bolso de trás: «Mestre-escola diga lá se for capaz: p'ra que lado é que me viro, p'ra que lado?»

É, em tempos em que tudo é volátil, incoerente, em que se dá o dito por não dito; em que o "apelo" dos líderes continua, na verdade a ser o de «Faz o que eu digo, não faças o que eu faço», não sei se o que exigem mais de nós é Tolerância ou Resistência. Da dúvida, que uma e outra se apoiem entre si: sejamos tolerantes e sejamos resistentes. Os nossos alunos certamente compreenderão que nem que a gente faça a quadratura do círculo lhes conseguiremos explicar os assuntos e apaziguar as dúvidas. A Terra, entretanto, vai girando em volta do Sol e a rapaziada vai crescendo.

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domingo, março 30, 2025

#TOLERÂNCIA91 - SOU CONTRA A MUDANÇA DA HORA

 #TOLERÂNCIA91 - SOU CONTRA A MUDANÇA DA HORA

As razões da mudança da hora, com 5 meses para a Hora de Inverno e 7 meses para a Hora de Verão (DST - Daylight Saving Time, é o ponto de vista do Hemisfério Norte), penso que começaram por ter a ver com a poupança de energia em tempo de guerra, na 1.ª Grande Guerra. Depois, com cessos e retrocessos, manteve-se a mudança em alguns países, não todos.

Países como o Japão, a Rússia, a Islândia e boa parte da África e Ásia não adoptam o DST. Os E.U.A., o Canadá, a Austrália e parte da Europa ainda mantêm a prática, mas, tanto quanto sei, com cada vez maior contestação. Desde 2018, a União Europeia anda a tentar acabar com a mudança da hora, propondo que cada país adopte a hora que quiser, seja a de Inverno ou a de Verão.

Eu sou adepto da Hora de Inverno, que é a que está mais próxima da hora solar, e é essa natureza que,

na minha opinião, devemos assumir. A hora solar tem a ver com o ciclo anual do Sol (estrela à volta da qual a Terra gira) e é determinada, digamos, pela posição do Sol no céu, com o meio-dia solar ocorrendo quando o Sol está no ponto mais alto do arco (aparente) que descreve no céu (o céu visto e vivido a partir da Terra).

Então, explicitando:

Um: sou contra a mudança da hora, sou de opinião que devemos optar por nos aproximarmos o mais possível da hora solar natural. Se não dá jeito para certas actividades económicas e sociais, mude-se o horário dessas actividades, dum golpe só ou progressivamente. Dizer que sou contra é expressão a minha atitude; e a atitude, como há muitos anos digo aos meus alunos, é uma predisposição comportamental.

Dois: resulta da minha atitude não aceitar, por bem que compreenda; resulta não me resignar, onde e quando puder expressarei o meu desacordo e procurarei alegar com informações lógicas, científicas e claras; finalmente, apenas tolero.

Cá está mais um exemplo em que a Tolerância se equaciona com a Aceitação, a Compreensão, e, neste caso, também com a Resignação e a Suportação (ui!, que palavrão...).

Sim, no meu caso pessoal, a mudança da hora é qualquer coisa que tolero com grande esforço dos mecanismos de auto-regulação do comportamento que são da responsabilidade do córtex pré-frontal.

Hoje de manhã, no momento de olhar e fotografar o nascer-do-sol, ainda abri o menu da máquina fotográfica para acertar o relógio do aparelho, mas acabei por não fazer nada. Tomei uma decisão, mais uma daquelas que nos últimos anos me tenho imposto com a duração de 365 dias seguidos: não, não altero a hora do relógio da máquina fotográfica!

A hora do telemóvel, para já, fica, é por causa dos compromissos profissionais a que estou obrigado enquanto não me reformar. Depois, quando a reforma chegar, logo verei o que que me vai apetecer decidir. Se tivesse que decidir hoje mesmo, sei bem qual seria a minha opção.

Como continuo a tentar estar acordado à hora do nascer-do-sol, sei que por volta do Solstício de Junho (antes, durante e depois) teria o Sol a nascer por volta das 5 da manhã, mas gostava muito que me fosse dada a oportunidade desse desafio.

Enquanto a União Europeia não se decide (nem Portugal), parece que o melhor lugar para um estágio de 1 ano é mesmo o país do Sol Nascente, o Japão. Para já, o que estará ao meu alcance, ainda este ano, será um mini-estágio de 15 dias.

Sem mudança de condição pessoal, resta-me, assim, tolerar, tolerar, tolerar...

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sábado, março 29, 2025

#TOLERÂNCIA90 - BRINCAR COM A TOLERÂNCIA

 #TOLERÂNCIA90 - BRINCAR COM A TOLERÂNCIA

É sábado, o dia foi levezinho, o pior é mesmo a expectativa de a noite que vem ter menos uma hora. Cá está, é uma situação que tenho de tolerar, mas não me resigno a aceitar.

Encontrei uma piada que me parece que se harmoniza muito bem com a minha vontade de que a hora não mudasse. Na verdade, é uma charada divertida:
— Porque é que o relógio preguiçoso é o mestre da tolerância?
— Como anda devagar, dá um minuto extra a toda a gente.

Gostei também de ler esta:
O tempo perguntou à tolerância: «Como é que consegues aguentar tudo?»
A tolerância respondeu: «Porque sei que um dia tu resolves tudo.»

Esta tem a ver com o texto de ontem (#TOLERÂNCIA89):
Um aluno perguntou ao professor de meditação:
— Mestre, como faço para tolerar pessoas chatas?
O mestre ligou um cronómetro e disse ao aluno:
— Comece contando até 60. Depois, repita toda a vida.

Agora esta é especialmente fina e discreta:
O tempo e a tolerância foram ao cinema. A tolerância sentou-se e relaxou. O tempo passou.

Para acabar, que hoje temos de ir mais cedo para a cama:
A paciência e o tempo fizeram um concurso para ver quem resistia mais. A paciência venceu. O tempo nem notou.

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sexta-feira, março 28, 2025

#TOLERÂNCIA89 - REAGIR COM TOLERÂNCIA AO ATAQUE DA RESPOSTA IMPULSIVA

 #TOLERÂNCIA89 - REAGIR COM TOLERÂNCIA AO ATAQUE DA RESPOSTA IMPULSIVA 

Se digo "reagir com tolerância" é porque podemos reagir doutra maneira, por exemplo, reagirmos também impulsivamente; ou reagirmos não impulsivamente, mas intolerantemente.

Se digo ataque é porque sentimos que estamos a ser agredidos, abordados de forma que contém algum grau de violência, violência essa que nos provoca mal-estar.

Se digo resposta impulsiva é porque existem outros tipos de resposta, não impulsivas, e que provavelmente esperaríamos que a resposta fosse uma dessas outras, mas não a impulsiva.

Quando estou numa relação de consulta psicológica (psicólogo-consulente) ou numa relação de aula (professor-turma), lido, em geral, com facilidade com as respostas impulsivas. Sim, são possibilidades comunicacionais que fazem parte do meu leque de expectativas-padrão. Tornou-se natural para mim lidar com elas de forma empática, tolerante, sei que estas competências comunicacionais fazem parte daquilo que faz um bom psicólogo e um bom professor. As reacções impulsivas de que as minhas palavras e os meus actos são alvo são objecto de crivo afectivo e cognitivo, e a carga agressiva que transportam são digeridas e neutralizadas.

Se nalgumas pessoas estas competências comunicacionais se manifestam como um dom natural, felizmente elas são para a generalidade dos psicólogos e dos professores competências treináveis, que podem ser adquiridas e aperfeiçoadas por aprendizagem; e podem ser mantidas por auto-observação e auto-análise sistemáticas.

Quando é que estou em maior risco de eu próprio reagir impulsivamente ou intolerantemente? É quando não estou em estado de alerta, quando não estou de “prevenção” para o que aí possa vir, quando estou com a guarda abaixada. Repito: quando estou mais em risco de reagir impulsivamente? Quando não estou alerta, quando estou com a guarda abaixada, é nessas alturas que fico vulnerável aos ataques das respostas impulsivas.

Geralmente, é quando estou de boa-fé, confiante na comunicação com o meu interlocutor (um colega de trabalho, um familiar, um amigo), quando alivio o controlo das coisas que digo (é verdade, o pensamento e o discurso mais rigoroso pedem mais esforço, mais trabalho mental, para reduzir a ambiguidade, o ruído e a inexactidão), que posso ficar surpreendido, apardalado, com qualquer coisa que me seja dito.

Tenho de ter a humildade de admitir que, nesta mesma circunstância de “guarda abaixada”, posso ser eu o interlocutor que responde impulsivamente, quer dizer, o agressor sou eu.

É por isso que qualquer um de nós que esteja sensível para esta questão deve cuidar de fazer a aprendizagem da reacção tolerante à resposta impulsiva; e deve fazer também a aprendizagem da inibição da resposta impulsiva.

Entretanto, que fique claro: a resposta impulsiva não é sempre má, negativa ou prejudicial! No âmbito da viagem que estamos a fazer no universo da Tolerância, a resposta impulsiva pode ser o saudável e justo «Basta!» aos comportamentos para os quais já se teve a Tolerância suficiente. Mas não é desse tipo de resposta impulsiva que estou agora a falar.

Voltando à Pedagogia e à aprendizagem, tanto para a reacção tolerante à resposta impulsiva como para a reacção intolerante à resposta impulsiva, deixem-me propor duas ou três coisas (acho que vão ser quatro…), que são uma espécie de, digamos, receitas da avó (É sexta-feira, final do dia, a semana foi muito intensa, estou cansado. Noutra altura poderei voltar aqui numa perspectiva técnica e sistemática).

Primeira receita: o muito velho e muito sábio princípio de contar até 10 antes de deixarmos sair qualquer coisa pela boca fora.

Segunda receita: observar os pensamentos que vêm por impulso e que palavras os consubstanciam. Se for, por exemplo, «Isso é completamente absurdo!», tentar matizar o radicalismo, nem que seja, se não encontrarmos nada melhor, substituir a forma exclamativa, peremptória, pela forma interrogativa, do tipo «Ouve cá, nãos achas que isso é um bocadinho absurdo demais?» (Cá está, na linguagem técnica diríamos que estamos a tentar uma formulação de reestruturação cognitiva).

Terceira receita:  não pôr o foco na pessoa, mas nas palavras. Um exemplo: em vez de dizer «Que bruto estás a ser!», reagir dizendo «Ui, o que estás a dizer é forte, não penso o mesmo que tu.»

Quarta receita: se contar até 10 não foi suficiente, desviar o olhar do interlocutor (mesmo que a conversa seja ao telefone, a figura do interlocutor está ali à nossa frente) e olhar para 3 ou 4 objectos que estejam ali à volta. Olhar com atenção!, o primeiro… agora o segundo… agora o terceiro… o quarto.

Quinta receita: (Desculpem-me, eu tinha dito quatro. É que esta é diferente das outras, que estão directamente ligadas ao momento em que a resposta impulsiva é produzida. Este é para se ir fazendo) praticar sistematicamente (uma a duas vezes por dia, em vários dias da semana) um pequenino exercício de meditação. Os meus alunos dos últimos anos podem testemunhar que logo na primeira ou segunda aula de cada ano lectivo lhes ensino um exercício de meditação (treino do foco atencional), que podem praticar autonomamente, bastando para tal usarem o metrónomo do telemóvel (que aluno hoje em dia não anda com um  telemóvel?) e contarem 74 batidas durante um minuto, de olhos fechados, e estando sentados (não de pé nem deitados). Como lhes explico nas aulas, o número de 74 batidas é egossintónica. Um minuto! Podem crer que o efeito, a longo prazo, é poderoso. Podemos dizer que este exercício segue o aviso que diz que não é em tempo de guerra que se limpam as armas.

As redes sociais e os telejornais estão cada vez mais cheios de respostas impulsivas e de reacções impulsivas. Os debates entre governantes e oposições, e entre deputados parlamentares, também. Temos todos de ir mais devagar.

Mais uma vez, a Pedagogia pode sugerir, a Educação pode realizar. E conversemos muito com as nossas avós; e também com os avós.

quinta-feira, março 27, 2025

quarta-feira, março 26, 2025

#TOLERÂNCIA87 - A ESCALADA SIMÉTRICA DA INTOLERÂNCIA (1.ª PARTE)

 #TOLERÂNCIA87 - A ESCALADA SIMÉTRICA DA INTOLERÂNCIA (1.ª PARTE)

Aquilo a que chamo escalada simétrica da intolerância é ao processo dinâmico que acontece entre duas pessoas ou entre várias pessoas do mesmo grupo; ou mesmo entre dois grupos diferentes. Neste processo dinâmico produz-se um conflito (que pode disseminar-se depois em vários conflitos) que opõe as pessoas do par, do grupo ou dos grupos, conflito esse que é alimentado e expandido em resultado de atitudes e acções protagonizadas pelas pessoas envolvidas, num toma-lá-dá-cá de gestos, palavras, acções; insinuações e atribuições, em que, na maior parte das vezes, se perde a noção de quem começou, de como começou, quando começou e onde começou.

No ambiente escolar, essa dinâmica pode surgir entre alunos de uma mesma turma, transformando

pequeninas diferenças de opinião, rivalidades ou estereótipos em ciclos de hostilidade crescente.
Qual é a matriz-padrão do conflito em escalada simétrica?

Número 1- OCORRÊNCIA-GATILHO: muitas vezes, uma ocorrência banal, aparentemente simples (uma “boca”, uma piada, um desabafo, dito de forma irreflectido ou tentando fazer humor), atinge inopinadamente a sensibilidade (duradoura ou circunstancial) dum colega.

Pode ser mesmo uma coisa simples, que começa como uma brincadeira mal interpretada, um desacordo sobre o trabalho em grupo que se está a fazer ou a expressão involuntária dum estereótipo, serve de rastilho. Ou pode mesmo um aluno fazer um comentário preconceituoso sobre a origem étnica de outro, gerando uma primeira reacção de indignação, reacção que pode expressada imediatamente ou guardar-se calada na forma de ressentimento e desejo de vingança.

Número 2 – REACÇÃO “NÃO FICAS SEM RESPOSTA”: o colega (alvo deliberado ou que se sente alvo) atingido ou ofendido responde imediatamente com igual ou maior hostilidade, ou então cala-se, vê crescer o ressentimento e o rancor dentro de si e imagina uma reacção a prazo, do tipo “a vingança serve-se fria”. Em ambos os casos, mais cedo ou mais tarde, há uma atribuição generalizadora da autoria da ofensa, do tipo «Tu e os da tua laia, são todos assim!». Esta reciprocidade negativa transforma o conflito individual numa disputa colectiva, juntando aos poucos aliados em ambos os lados.

Número 3 – POLARIZAÇÃO GRUPAL: Os alunos dividem-se em "grupos" antagónicos, a partir de afinidades (amizades de longa data; rapazes dum lado, raparigas do outro; opções clubísticas ou partidárias; bairros, nacionalidades ou etnias; etc.), e pouco a pouco cavam mais profundamente o fosso entre si, consolidando identidades dinâmicas (‘ad hoc’ ou de longa data) opostas. A turma passa a funcionar como um ecossistema de tensão, onde pequenos gestos (olhares, risadas, exclusão) são interpretados como provocações intencionais.

Número 4 – NORMALIZAÇÃO DA INTOLERÂNCIA: A hostilidade torna-se parte da cultura da turma (aberta ou velada). Insultos, apelidos ofensivos ou exclusão social passam a ser vistos como "normais", e os alunos (pelo menos alguns) hesitam em intervir por medo de se tornarem alvos de ataques ou represálias.

Número 5 – CICLO DE RETALIAÇÃO CONTÍNUA: cada nova acção gera uma reacção mais intensa. Por exemplo, se um grupo exclui o outro de uma actividade, a resposta pode ser uma sabotagem do trabalho alheio, perpetuando o ciclo.

Dizem os manuais que um dos principais factores que alimentam a escalada simétrica da intolerância é a falta de mediação do conflito. Sim, a passividade da acção dos professores (ou dos responsáveis da escola), ou mesmo a ausência total de qualquer acção dos professores (ou dos responsáveis da escola), é bastante nefasta. Essa acção, acontecendo logo no início, esvaziando à nascença a escala intolerante em embrião, é de poderoso efeito pedagógico e educativo.

Na 2.ª parte deste texto, que publicarei daqui a dias, muito em breve, procurarei enumerar outros factores que alimentam a escalada simétrica da intolerância; também as consequências da escalada na turma, nos alunos que a compõem; e, finalmente, como pode o ciclo vicioso da escalada da intolerância ser quebrado.

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