sábado, dezembro 22, 2007

Até sempre, querido pai!

Um dia, ao sair da escola, ia eu a caminho de casa, um aluno meu – que muito me estima, e que eu muito estimo – gritou-me, do outro lado da rua: - Setor, não tem vergonha?... Um professor a andar à pobre?... a ir a pé para casa?...
Sorri para ele, acenei-lhe e gritei-lhe um comentário qualquer, de circunstância.
Mais recentemente, ao sair de casa, à pobre, a caminho da escola, uma vizinha dos meus pais chamou-me e parámos a falar um com o outro. Curiosamente, paráramos ali mesmo à porta da casa deles.
- Os seus pais, Fernando?... Como está o seu pai?...
Respondi-lhe o que eu me habituara já a responder, todos os dias, tentando, apesar de tudo, dizer qualquer coisa que não soasse a cassete repetida e, no mínimo, respeitasse a atenção que assim as pessoas dispensavam sentidamente aos meus pais. – Está fraquinho – dizia-lhes eu – mas está a tentar aguentar-se. Está junto à filha, que não o larga. Assim está bem.
Mal sabia eu que, mesmo que incipientemente, estava já a seguir o exemplo do nosso pai, como comprova o comentário que a nossa vizinha logo de seguida me fez. Disse assim a senhora: O seu pai faz-nos falta, sentimos a falta dele. Quando o víamos, ele tinha sempre qualquer coisa para dizer, não era só os bons-dias, não era só cumprimentar as pessoas. E o que dizia tinha a-propósito. Sabia-nos bem. Agora sentimos a sua falta aqui no bairro.
Isto teve para mim tal significado que, imediatamente depois de me afastar da senhora, peguei no caderno de apontamentos que sempre me acompanha e registei aquelas palavras sinceras, claras e nostálgicas. Não queria esquecê-las, nem deturpá-las.
Quando retomei o caminho para a escola, pude tomar claramente consciência de alguns valores que sempre pautaram a vida do nosso pai, desfiando, naquele rotineiro caminho de todos os dias de aulas, lembrança atrás de lembrança, todas aquelas que tiveram tempo de me ocorrerem ao pensamento: acima de todos esses valores, tinhas, querido pai, o valor da família, o valor da vizinhança e da cordialidade social, bem patentes no comentário muito sentido daquela nossa vizinha.
Andar à pobre… pois é…
Outra lição que tu nos deixas, a lição da profunda riqueza humana de quem anda a pé: a riqueza do encontro.
Quero, cada vez mais, andar na vida como tu andavas, pai, a pé, ou à pobre, tanto faz, a espalhar cordialidade e bem-estar à minha volta, como tu sempre fizeste.
Descansa agora na paz que mereces. Confia que continuaremos a seguir os teus exemplos e as tuas lições de vida.
Perdoa-nos os nossos desencontros e desentendimentos. Perdoa-nos as vezes que te deixámos triste connosco. Sabemos que sempre tiveste muito orgulho nos teus filhos. Sabes que podes continuar a ter.
O Natal é a festa da família. Tu fazias da família a tua ocupação e a tua preocupação durante o ano todo. E na família estavam também os teus vizinhos e os teus amigos.
Todos nós estamos muito gratos pelo grande Natal que sempre nos deste.
Bem-hajas! Obrigado, pai querido!
Gostamos muito de ti!
Até sempre!...

domingo, dezembro 09, 2007

No simbolismo das saudações, África 1 - União Europeia 0



Olhava quase distraidamente a televisão, que transmitia, ontem de manhã, a chegada dos governantes à abertura da Cimeira União Europeia - África, até que qualquer coisa insidiosamente parecia querer tomar conta da minha atenção e da minha análise.


Finalmente percebi o que era. Ligava-se ao que foi o tema principal da maioria das minhas aulas na semana passada: a comemoração do Dia Internacional dos Direitos Humanos, no próximo dia 10. Falei aos meus alunos em diversidade cultural e, entre outras coisas, falámos sobre o que poderão ser os traços distintivos entre as etnias, as culturas, as sociedades. Por exemplo, a forma de saudação.


E o que ontem acabei por consciencializar ao assistir à chegada de presidentes, primeiros-ministros e outras individualidades foi a constatação que as saudações mais expressivas, mais calorosas, foram de líderes africanos. A mão direita que, depois de cada aceno, é docemente encostada ao coração [Esta sequência não é a mesma coisa que, por exemplo, os americanos e franceses fazem, em saudação aos símbolos nacionais, a bandeira ou o hino. Neste caso, é uma espécie de "continência civil"]; ou que, depois do mesmo aceno, se cola num abraço à mão esquerda, erguidas ambas à altura do rosto ou acima da cabeça. Tanto numa como na outra maneira, os olhos de quem saúda se mantêm fixos nas pessoas saudadas. Estes tipos de saudação são muito mais envolventes.


Sei que as boas e as más impressões que nos marcam têm valor absorvente, quer dizer, se as impressões são boas, buscamos o que as confirme. Se são más, fazemos o mesmo. Regressei da Tanzânia impressionado com a afectividade social que vi em muita gente, grandes e pequenos.


Sei que o que vi agora na passadeira vermelha por onde passaram tantos líderes políticos confirmam o que, se calhar, queria ver... Pois bem, vou continuar a olhar, tentando fazê-lo com isenção.


Para já, faço questão de que, no futuro, os meus cumprimentos a distância tenham a expressividade dos que vi em pessoas que têm África no sangue e em África lideram os destinos de tanta gente.

Outra conferência, outra oportunidade... na Tanzânia

Tentei dar o máximo de atenção possível ao desenvolvimento do Encontro entre os líderes da Comunidade Europeia e os líderes do Continente Africano, que se juntaram em Lisboa neste fim-de-semana.
Procurei, quase avidamente, tudo o que pudesse assinalar a presença e a participação da delegação da Tanzânia. E pesquisei na Net alguns ecos que os jornais da Tanzânia pudessem estar a fazer do Encontro de Lisboa, especialmente aqueles jornais que eu pude ler quando lá estive, e em que trabalham jornalistas com quem já contactei depois de voltar a Lisboa.
Foi assim que fui levado a ler a seguinte notícia, que apreciei (África não está mesmo parada!...) e que aqui deixo transcrita, com a intenção de que seja um pouco mais divulgada:


Another conference, another opportunity
2007-12-08 10:06:40 By Editor

Tanzania is set to play host to the Fifth African Population Conference, due to open at the Arusha International Conference Centre and run for a full five days. It is jointly organised by the Tanzanian Government, specifically the Planning, Economy and Empowerment ministry, and the Union of African Population Studies (UAPS). The multidisciplinary forum is expected to bring together a wide variety of stakeholders, among them scientists, policy makers and development partners, who will be deliberating on the development challenges posed by population growth. Delegates are also expected to exchange ideas and experience that could help them approach the challenges embedded in the continent�s development plans and strategies better equipped and therefore more knowledgeable and with enhanced confidence. Knowing as we very well do the monumental problems that are the lot of most of Africa as an entity and most of the individual countries that make up the continent, we wholeheartedly welcome the convening of the Arusha conference. We see it as an auspicious occasion that has come at a most opportune moment. Deliberations at the forum, to be opened by Zanzibar President Amani Abeid Karume and closed by Zanzibar Chief Minister Shamsi Vuai Nahodha, are scheduled to revolve around the theme: ``Emerging Issues on Population and Development in Africa``. This suggests that delegates will spend part of their time brainstorming on the proverbial vicious circle where population growth is seen as the villain causing poverty in the world and world poverty is therefore viewed as a direct consequence of population growth. Of course, humankind has since discovered that things are much more complicated than that. That is why the Arusha conference will delve into the causes and consequences of population growth with a very open mind and a high degree of keenness. Delegates will have a lot on their menu, discussing issues like the impact of migration and urbanisation on development as well as maternal health and child survival and development. They will also deliberate on issues like transitions in health patterns, sexual behaviour and sexuality, and the link between schooling and employment. There will be various other hugely pertinent items on the forum`s agenda. Happily, these will include how to tame the impact of the scourge of HIV/Aids for the good of this generation and posterity and ensuring that population does not eat deeply enough into the environment to put sustainable development at risk. The conference will have the advantage of benefiting from the dignified presence of a rich mix of development experts who will be contributing to the deliberations at the AICC. And it promises to be a wonderful opportunity with the delegates having great company able to translate itself into the innovative approaches we need to achieve our development goals, including the much-touted MDGs. By definition, the Government has excellent knowledge of the causes of the social, economic and other problems our people are faced with. It should use next week�s conference, which it is co-organising, to reflect on how best to solve those problems.
SOURCE: Guardian